Barragens na gestão dos recursos hídricos

A disponibilidade hídrica de uma bacia hidrográfica consiste na relação entre a oferta de água superficial e a demanda por essa água em diversas atividades humanas, sendo o principal dispositivo de orientação das atividades de gestão dos recursos hídricos e está diretamente associada à capacidade de suporte e regulação dos mananciais que a compõe e a pluviometria da região, ou seja, à quantidade de precipitação de chuvas, geralmente medida em milímetros, que ocorre nessa área durante um determinado período de tempo. Durante períodos de seca, a vazão dos rios diminui, o que pode acarretar impactos à disponibilidade hídrica local se não houver um planejamento adequado.

Nas últimas décadas, outro fator tem impactado o comportamento das chuvas e, consequentemente, da gestão de recursos hídricos, que são as mudanças climáticas e a ocorrência de eventos hidrológicos extremos. De forma cada vez mais frequente, chove-se demasiadamente fora do normal em curtos espaços de tempo e em compensação, longos períodos de seca causam severos problemas sociais, econômicos e ambientais às regiões afetadas.

Para driblar esses eventos e garantir um fornecimento seguro e contínuo de água por períodos de escassez é essencial a retenção e armazenamento de água, que pode ser feito tanto da forma tratada, em reservatórios metálicos ou caixas d’água, em áreas urbanas, ou de sua forma bruta, através da construção de barragens que represam a água dos rios.

Segundo registros arqueológicos, as barragens têm desempenhado um papel vital na vida das pessoas ao longo dos últimos 5 mil anos. A mais antiga do mundo é a de Jawa, na Jordânia, datada em torno de 3.000 AC. Historicamente, elas têm sido uma fonte confiável de água, permitindo que populações coletem e armazenem água durante períodos de abundância para uso durante as secas. Essas estruturas foram fundamentais na formação de reservatórios de água para comunidades urbanas e rurais, possibilitando a irrigação e a produção de alimentos.

As barragens, caracterizadas como estruturas artificiais projetadas para conter água com o propósito de armazenamento ou controle, abrangem uma ampla gama de tamanhos e tipos. Essas estruturas desempenham papel essencial no fornecimento de água, geração de energia hidrelétrica, controle do fluxo dos rios para prevenir inundações e facilitar a irrigação, entre outras funções importantes destacando-se como importante elemento de usos múltiplos.

As barragens construídas para o armazenamento e controle exclusivo de água, geralmente, atendem a uma variedade de propósitos, incluindo abastecimento de água para uso doméstico e industrial, irrigação agrícola, navegação, recreação, controle da sedimentação, prevenção de inundações e geração de energia elétrica.

Inicialmente, as barragens foram construídas para combater a escassez de água durante períodos secos. Com a Revolução Industrial, sua importância aumentou devido à crescente demanda por água e energia. Isso impulsionou o aprimoramento das técnicas de projeto e construção de barragens, resultando no surgimento das primeiras estruturas modernas, como as barragens de concreto e caráter multiuso.

Cada barragem requer uma fiscalização específica, sendo o agente privado ou governamental com direito real sobre as terras onde se localizam a barragem e o reservatório ou que explore a barragem para benefício próprio ou da coletividade o responsável legal pela segurança da barragem A Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA) é responsável por estabelecer as regras operacionais para o funcionamento das barragens destinadas ao armazenamento de água para abastecimento e controle de enchentes. É atribuição da ANA organizar, implantar e gerir o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens (SNISB),  assim como promover a articulação entre os órgãos fiscalizadores de barragens e coordenar a elaboração do Relatório de Segurança de Barragens.

Demanda de água

Segundo o Relatório Mundial das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento dos Recursos Hídricos 2024, desenvolvido com o suporte de mais de 20 agências do Sistema ONU que integram o esforço interagencial denominado ONU-Água, o consumo de água doce aumentou 6 vezes no último século e continua a avançar a uma taxa de pouco menos de 1% ao ano, devido ao crescimento populacional, o desenvolvimento socioeconômico e às mudanças nos padrões de consumo. Esse aumento é mais significativo em países de renda média e baixa, especialmente em economias emergentes. 

A falta de água está se tornando um problema endêmico devido à mudança climática, poluição e demanda exagerada. A mudança climática está agravando esse cenário, prevendo-se um aumento na escassez sazonal de água em regiões onde ela é atualmente abundante, além de agravar a situação em áreas já afetadas pela baixa disponibilidade de água. Atualmente, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de metade da população mundial passa por uma situação de grave escassez de água durante, pelo menos, parte do ano. Um quarto da população mundial enfrenta níveis “extremamente altos” de estresse hídrico, por usar mais de 80% de seu suprimento anual de água doce renovável.

Na Conferência da Água 2023, promovida pela ONU, foi apontado que até 2025, é prevista uma lacuna de 40% entre a oferta e a demanda global de água. Devido à crise climática, a ONU, também, prevê que até 2030, cerca de 700 milhões de pessoas correm o risco de serem deslocadas devido à falta de água.

Estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2022, mostra que o consumo de água no Brasil aumentou em geral. Em 2020, o brasileiro usou em média 117,5 litros por dia por pessoa, o que representa um acréscimo de 1,5 litro em relação ao registrado em 2018, valores esses acima do recomendável pela ONU, que seria de 110 litros de água por pessoa ao dia. Além disso, o custo da água também teve um acréscimo de 17% em dois anos.

O Instituto Trata Brasil aponta que um dos motivos para o aumento no custo da água é o preço dos insumos necessários para o tratamento. Quanto maior a poluição dos rios e a dificuldade de tratamento resultante disso, mais elevado se torna o custo.

A importância das barragens 

A segurança hídrica é alcançada quando existe disponibilidade adequada de água em termos de quantidade e qualidade para atender às necessidades humanas, sustentar as atividades econômicas e preservar os ecossistemas aquáticos. Além disso, é essencial que haja um nível aceitável de risco em relação a eventos como secas e enchentes.

Essencialmente, a principal função de um reservatório criado por uma barragem é armazenar água durante os períodos chuvosos para posterior utilização durante os períodos secos, quando a precipitação é escassa ou inexistente. Esses reservatórios, quando operados de forma adequada, também podem previamente operar com níveis baixos de água, permitindo que absorvam as ondas de cheia, regularizando a vazão dos cursos d’água, tanto para períodos muito chuvosos como de estiagem.

Por meio das barragens as usinas hidrelétricas também conseguem regular a vazão da água para obter o desnível necessário e assegurar a produção de energia. Isso envolve a criação de um reservatório, cuja profundidade aumenta durante o processo. À medida que o tamanho do reservatório aumenta, a velocidade de escoamento da água é reduzida. É importante manter um regime de vazão que preserve os ecossistemas, garantindo ao mesmo tempo a produção de energia e a disponibilidade adequada de água nos mananciais e rios.

Outra função importante é o controle de abastecimento durante estiagens. Em muitas regiões onde as secas são prolongadas e severas, as barragens são essenciais para garantir o fornecimento de recursos hídricos, armazenando água nos reservatórios. Em várias partes do mundo, o acesso à água é frequentemente comprometido devido à escassez nos rios durante as secas. Portanto, é fundamental desenvolver alternativas e promover o consumo consciente de água.

As barragens têm mostrado ser bastante eficazes, no entanto, sua operação requer investimentos significativos em termos financeiros, recursos humanos e ambientais, além de uma constante supervisão, monitoramento e manutenção para garantir seu funcionamento adequado e prevenir acidentes, de modo que garanta a segurança das comunidades próximas e proteja o meio ambiente, incluindo a fauna e a flora local. 

Flávio Forti Stenico
Engenheiro e assessor técnico do Consórcio PCJ

Foto: BRK Ambiental

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