Alterações no Código Florestal poderão intensificar os problemas de disponibilidade hídrica no futuro

A afirmação acima foi feita pelo Prof. Dr. Ricardo Ribeiro Rodrigues da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ-USP), durante a sua apresentação no evento “Diálogos sobre o Novo Código Florestal e Restauração Ecológica”, promovido pelo Consórcio PCJ e Petrobras/Replan, com o apoio da Iandé –Educação e Sustentabilidade, da Prefeitura Municipal de Limeira e do Laboratório de Ecologia e Restauração Florestal (LERF – ESALQ-USP).Segundo Rodrigues, “Os problemas que enfrentamos desde ano passado com a oferta de água serão muito piores no futuro porque teremos menos áreas preservadas com a aprovação dessa atualização do código florestal”.

Isso porque o novo código florestal (lei 12.727 de 17 de outubro de 2012) alterou as regras de preservação e recuperação de Áreas de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal. As matas ciliares em rios, ribeirões, córregos e nascentes são consideras APPs e com importante papel para infiltração de água no solo, evitar contaminações e assoreamento dos mananciais. Elas sofreram alterações bastante significativas com a nova legislação. Pelo código antigo, datado de 1965, a área a ser preservada às margens dos rios levava em consideração o leito maior do curso d’água, ou seja, o espaço que ele ocupa em período de cheias. A lei 12.727 considerou apenas o leito normal do rio, além de exigir a preservação de apenas cinco metros de matas ciliares em propriedades rurais de até 1 módulo fiscal, quando no código de 1965 o mínimo era de 30 metros. Só nas Bacias PCJ isso representa uma perda média de no mínimo 40%, podendo chagar a 80%, de áreas que precisam de recuperação e consequentemente afetará a qualidade e quantidade de água nos mananciais. Outra alteração polêmica é a que consta no artigo 67 do novo código, em que há a possibilidade de dispensa de propriedades rurais de até 4 módulos fiscais manterem reservas legais. Estima-se que 25% da área agrícola no país não precisarão manter mais as Reservas Legais.

As APPs são áreas protegidas, cobertas ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. Já as Reservas Legais, além de auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa; podem ser utilizadas para o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural.

Área Agrícola x Área a ser preservada

Em sua apresentação, o pesquisador da ESALQ expôs diversos exemplos de áreas degradadas devido à expansão da atividade agrícola, em muitos casos, em locais de área de preservação permanente e de reserva legal, sem aptidão para agricultura, portanto, em áreas em que não se há o aproveitamento eficiente da agricultura e não precisariam ser utilizadas. Na visão dele, os argumentos de que apenas 1/3 do território brasileiro é usado para agricultura e a aplicação efetiva do código florestal de 1965 acarretaria uma diminuição ainda maior dessa área, não se justifica para a flexibilização da legislação de preservação, pois apenas com a aplicação de tecnologias melhora-se muito a produtividade sem expansão de área.

“A área para cultivo de grãos aumentou 10% de 1975 a 2010, enquanto a produção aumentou mais de 268%, enfatizando o conceito de se usar bem a área que se possui”, afirmou Rodrigues, completando, ainda, que o grande motivador para alterar o Código Florestal foi o lobby do setor pecuarista, que possui produtividade baixa e representa ¾ da produção agrícola nacional.

“É necessário tecnificar a pecuária, falta ao Brasil uma política agrícola em conjunto com a política ambiental”, comentou.

Novo Código: Poucos Avanços

Rodrigues destacou como avanço do Novo Código Florestal a implantação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que permitirá um panorama e diagnóstico rural do país. Até o momento, 52% das áreas já foram cadastradas e espera-se com esse diagnóstico apresentar uma proposta regularização das áreas irregulares.
O pesquisador ainda atentou para a importância de intensificar a preservação de matas ciliares promovendo corredores de interligação de ambientes fragmentados, além de manter e recuperar as matas degradadas, pois, elas possuem papel fundamental na conservação da biodiversidade de espécies. Ele expôs, também, a necessidade de se restaurar as áreas ribeirinhas e agrícolas degradadas ou de baixa aptidão agrícola. “A coexistência harmoniosa entre as áreas agrícolas e as áreas de vegetação nativa não é uma possibilidade, mas sim uma necessidade”, concluiu.

Técnicas Alternativas a Recomposição Florestal

A Ma. Julia R. Mangueira, que também é doutoranda pela UNICAMP – Biologia Vegetal / LERF, apresentou em seguida as perspectivas e novos desafios da restauração ecológica em escala local e regional, associando produção agrícola, conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos. Julia evidenciou alternativas mais baratas para projetos de recuperação florestal, como o uso da técnica de semeadura por berços, que consiste no plantio das sementes em covas misturadas ao substrato, acarretando menor custo e com sobrevivência das mudas semelhante ao plantio convencional.

“As espécies mais indicadas para esse tipo de plantio ainda estão em estudo e desenvolvimento”, comentou Julia.
Em paralelo a essa modalidade de plantio, a pesquisadora orientou que seja feito a adubação verde, realizada entre as linhas de semeadura, no qual espécies protetoras vão crescendo ao lado das mudas de recuperação e, assim, protegendo-as de outras espécies, como a braquiaria. “Depois que o grupo de recobrimento – as mudas matrizes – cresce é possível entrar no grupo de diversidade, reduzindo custos com mortalidade e de plantio, essa fase ocorre após um ano e meio do início dos plantios”, esclareceu.

O coordenador de projetos do Consórcio PCJ, Guilherme Valarini, acredita que as técnicas apresentadas são importantes alternativas e que devem ser agregadas nos projetos de recuperação de matas ciliares da entidade. “Um diagnóstico preciso é o primeiro passo para elaborar um plano de restauração ecológica de acordo com a realidade e característica de cada região”.

Os “Diálogos sobre o Novo Código Florestal e Restauração Ecológica” aconteceu no teatro Nair Belo, em Limeira (SP), com a presença de mais de 100 pessoas, entre educadores, técnicos, Defesa Civil, ONG’s, gestores públicos, empresas, pessoa física, lideranças de bairro, universitários e membros de câmaras técnicas dos Comitês PCJ.

O Consórcio PCJ, por meio do Programa de Proteção aos Mananciais, elaborou diversas ações de conscientização à época das discussões sobre o Novo Código Florestal, atentando para os potenciais danos à preservação das matas ciliares e de nascentes. Inclusive foi uma das poucas entidades que formalizou sua insatisfação com as novas regras por meio de ofício para Ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira, em setembro de 2012.

 Ma. Julia R. Mangueira
Julia explanou sobre a recuperação ecológica.
Evento contou com mais de 100 participantes.
Prefeito de Limeira, Paulo Hadich, faz a abertura do evento.
Professor Rodrigues apresenta as alterações do Novo Código Florestal.

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