Relatório da ONU atenta que apenas 17% das metas dos ODS estão sendo cumpridas
Por Andréa Borges*
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) são um conjunto de metas que os países do mundo inteiro se comprometeram a atingir até 2030, abrangendo vários temas, como por exemplo, acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. No total, 17 ODS balizam essas metas, dentre eles, o de número 6 (Água Potável e Saneamento) e o 14 (Vida na Água), que se relacionam de forma direta com a gestão de recursos hídricos. Estudos tem atentado para o baixo atendimento das metas de forma generalizada em todos os países. Mas, de fato, caso os ODS não sejam cumpridos, como isso pode impactar a sustentabilidade hídrica das bacias hidrográficas?
O Relatório sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 2024, realizado pela Organização das Nações Unidas (ONU), apontou que o progresso está muito inferior do que é necessário para atingir as metas. O documento revelou que menos de um quinto das metas (17%) estão na direção correta para serem realizadas. Isso mostra que o mundo não está cumprindo as metas determinadas pela Agenda 2030, e que é necessário um maior financiamento e cooperação internacional para que os ODS sejam alcançados e, assim, não deixar ninguém para trás.
De acordo com o relatório, mais de 23 milhões de pessoas entraram na linha da pobreza extrema em 2023, e o número de civis mortos em conflitos armados disparou. O documento assinalou, também, sobre o aquecimento do planeta, alertando para os riscos de temperaturas próximas do limite de 1,5°C, estabelecido pelo Acordo de Paris. Porém, essa fronteira acabou de ser rompida. Segundo a Organização Meteorológica Mundial (WMO, na sigla em inglês), o ano de 2024 foi o mais quente da história, com a temperatura média global ficando acima de 1,6°C, quando comparado ao período pré-industrial, entre os anos de 1850-1900.
No site oficial da ONU (Clique aqui) a organização reforça a necessidade de mais investimentos nos países em desenvolvimento, a resolução dos conflitos por meio do diálogo e da diplomacia, e a realização de parcerias eficazes para aceleração da implementação de ações que possibilitem atingir as metas dos ODS e frear o aquecimento global.
Durante a coletiva de imprensa sobre o Relatório, em julho de 2024, o secretário-geral da ONU, António Guterres, apontou: “Faltando mais de seis anos, não podemos deixar de cumprir a nossa promessa para 2030 de acabar com a pobreza, proteger o planeta e não deixar ninguém para trás”.
Como está a implementação dos ODS no Brasil
Lançado todo ano, o Relatório Luz é um documento elaborado pelo Grupo de Trabalho da Sociedade Civil (GTSC) para a Agenda 2030, com o objetivo de analisar a implementação dos ODS no Brasil, além de mostrar o que o país deve fazer para cumprir as metas estabelecidas pelos ODS. O mais recente Relatório foi divulgado em 2024, e pontua o país como uma “promessa incumprida”. Os dados mostram que, em 2023, das 168 metas aplicáveis, 58 tiveram progresso insuficiente, 13 progresso satisfatório, 40 retrocederam e 43 seguiam estagnadas, com 10 delas ameaçadas e 4 sem informações para avaliação.
Na pesquisa, o GTSC relatou que o ODS 6, “Água potável e saneamento”, não avançou em 2023. Apesar da destinação orçamentária ter aumentado 16,19%, o Brasil aplica muito menos que os R$50 bilhões necessários para garantir a universalização da água potável e do saneamento até 2033. Dessa forma, nenhuma meta deste ODS alcançou resultados positivos. Dados mostram que, em 2022, apenas 52,2% do esgoto gerado eram tratados, com uma disparidade enorme do Norte (19,8%) para o Sudeste (61,8%).
No ODS 14, “Vida na água”, houve evolução, mas ainda insuficiente. A vida na água segue impactada, e o Brasil continua sem monitorar os dados da pesca regulamentada e da pesca ilegal, frequentemente associada a violações dos direitos humanos e laborais, trazendo grave ameaça aos oceanos e conservação da biodiversidade. O documento mostra que apenas 2,5% da Zona Econômica Exclusiva (200 milhas marítimas da Costa) possuem unidades de conservação de proteção integral, muito inferior ao desejado (30%). Além disso, um dado de 2020 apontou que o Brasil despeja cerca de 325 milhões de quilos de plástico no oceano todos os anos.
Os ODS nas Bacias PCJ
O Plano de Recursos Hídricos das Bacias Hidrográficas dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ) 2020-2035 possui atividades e metas que contribuem com a implementação dos ODS em nossa região hidrográfica. O plano possui como principal objetivo promover a segurança hídrica para um desenvolvimento sustentável nas Bacias PCJ. Os ODS 6 e 14 possuem relação direta com as ações do plano, visto que, uma das metas estabelecidas, é a de que todos os municípios presentes na região das Bacias PCJ tenham 98% de coleta e 100% do esgoto tratado até 2035, inclusive com tratamento terciário, para atender à meta de que todos os rios da bacia hidrográfica sejam reenquadrados em classe 3.
Um rio de classe 3, na Resolução CONAMA 357/2005, possui águas que podem ser destinadas ao: Consumo humano, após tratamento convencional ou avançado; irrigação de culturas arbóreas (Cultivo de árvores), cerealíferas (Lavouras de cereais) e forrageiras (Plantas destinadas à alimentação animal); Pesca amadora; Recreação de contato secundário (Pesca, Navegação) e Dessedentação de animais (Água potável aos animais). As Classes vão desde a especial (a melhor) até a classe 4 (que não pode ser utilizada para o abastecimento público).
Exemplos de tratamento terciário nas Bacias PCJ são as Estações de Produção de Água de Reuso (EPAR), implantadas pela Sanasa, em Campinas. Nesse tipo de estação o efluente é tratado por meio de membranas ultra filtrantes, possibilitando uma elevada eficiência de tratamento (em torno de 99%), produzindo um efluente com características que tornam possível sua reutilização para diversos fins não potáveis.
As ações do Consórcio PCJ e os 17 ODS
Alinhado à Agenda 2030, o trabalho do Consórcio PCJ contribui para o atingimento de diversas metas dos ODS, em especial as que tratam sobre a gestão dos recursos hídricos, proteção e sensibilização ambiental, como os ODS 4 (Educação de Qualidade), 6 (Água Potável e Saneamento), 7 (Energia Limpa e Acessível), 11 (Cidades Sustentáveis), 13 (Ação contra a mudança global do clima), 14 (Vida na Água), 15 (Vida Terrestre) e 17 (Parcerias e Meio de Implementação). Importante destacar que não existe um ou outro ODS mais importante; segundo a orientação da ONU, todos possuem igual relevância e todos devem ser implementados.
Através do Programa de Proteção dos Mananciais, a entidade já plantou mais de 4,5 milhões de mudas de árvores nativas em áreas de matas ciliares (à beira de rios, represas e nascentes), proporcionando a recuperação de 2,7 mil hectares, o equivalente a 3,6 mil campos de futebol. A iniciativa colabora com o ODS 13 “Ação contra a mudança global do clima”, já que a recuperação florestal permite o sequestro de carbono da atmosfera e contribui no combate ao aquecimento global e na ampliação da oferta hídrica, além de contribuir com o ODS 15, “Proteger a vida terrestre”, promovendo o uso sustentável dos ecossistemas terrestres.
O Programa de Educação e Sensibilização Ambiental visa capacitar a população, gestores públicos, empresas e instituições sobre a importância de preservar os recursos hídricos e usá-los de forma sustentável. Desde 1994, o Consórcio PCJ investe em ações nessa temática, como o Projeto Gota d´Água, no qual participam, em média, 150 mil pessoas por ano. O projeto dialoga com vários ODS, dentre eles os de número 4, “Educação de Qualidade”, e o 11, “Cidades e comunidades sustentáveis”, gerando uma população mais consciente sobre os impactos dos seres humanos ao meio ambiente.
Iniciativa do Consórcio PCJ, a Casa + Sustentável é um espaço dedicado a ensinar sobre práticas sustentáveis de consumo consciente de água e energia elétrica de maneira interativa, lúdica e inovadora. Dessa forma, o local sensibiliza sobre diversas metas dos 17 ODS. Os visitantes iniciam a visita pelo ambiente “Caminhos da Sustentabilidade”, trilha que dá acesso à casa e que possui em seu trajeto 17 totens, um para cada ODS, onde é explicado sobre as metas de cada um deles e sua importância. O percurso interno é composto por 12 ambientes, pelo qual os visitantes terão contato com informações sobre o uso eficiente da energia elétrica e o consumo consciente da água. A Casa fica localizada na cidade de Americana (SP) e pode ser visitada mediante agendamento prévio pelo site: www.agua.org.br/casamaissustentavel.
A Escola de Água e Saneamento é outra iniciativa do Consórcio PCJ alinhada aos ODS da ONU. A central de cursos online e presenciais tem o objetivo de capacitar os operadores e técnicos dos serviços de saneamento, além de realizar cursos sobre gestão de recursos hídricos e áreas correlatas. As capacitações em ambiente on-line acontecem via plataforma Moodle e podem ser acessadas no endereço: https://escola.agua.org.br. As turmas presenciais ocorrem em datas específicas e necessitam de inscrições prévias. Todos os cursos são gratuitos, e já foram capacitados mais de 3.000 alunos, além de realizadas 11 turmas presenciais dos cursos de Operadores de ETA e ETE. As atividades da Escola da Água se alinham ao ODS 4 “Educação de qualidade”, que visa assegurar a educação inclusiva, equitativa e de qualidade.
A importância dos ODS para um mundo mais justo e sustentável
Os dados aqui apresentados apontam para o longo caminho a ser percorrido para o alcance de todas as metas propostas pelos ODS. Estamos a cinco anos de seu cumprimento, e ainda faltam maior comprometimento e financiamento dos países com a Agenda 2030. Essa lacuna impacta o meio ambiente, a justiça social e o futuro do planeta. O aquecimento global pode comprometer a existência de todos os seres vivos, sobretudo, de países mais vulneráveis, e afetar o comportamento das precipitações de chuva ao redor do globo, o que pode influenciar negativamente a gestão de recursos hídricos, com o clima cada vez mais instável.
Deste modo, o não atendimento das metas dos ODS impacta significativamente a gestão da água, o que deve ampliar a necessidade de monitoramento, planejamento e ações em gerenciamento de recursos hídricos. Os governos, sejam eles no âmbito federal, estadual ou municipal, devem iniciar imediatamente seus grupos de avaliação da situação da implementação dos ODS e formas de acelerar o seu atendimento.
O Consórcio PCJ, por sua história de busca pela disponibilidade da água, que perpassa por atividades que envolvem diversas áreas para garantir a sustentabilidade e segurança hídrica regional, já trabalhava os temas propostos pelos ODS desde a sua fundação, em 1989. Nas últimas décadas, a entidade tem ampliado ainda mais o trabalho em torno do monitoramento e mitigação dos eventos hidrológicos extremos, que a cada ano se intensificam ainda mais devido às mudanças climáticas. O compromisso com as metas dos ODS deve ser também um compromisso com a gestão eficiente e equânime da água, que possibilite justiça e desenvolvimento social, econômico e ambiental.
Sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
Criado em 2015 durante a Cúpula das Nações e adotado pelos países-membros da ONU, os ODS representam um plano de ação global para eliminar a pobreza extrema e a fome, fornecer educação de qualidade para todos, além de proteger o planeta e promover sociedades pacíficas, através da cooperação internacional e investimentos nas ações.
No total, são 17 objetivos com 169 metas específicas a serem alcançadas até 2030, que envolvem temáticas como: Erradicação da pobreza, segurança alimentar e agricultura, educação, uso sustentável da água e oceanos etc. Os ODS são interconectados e abordam os principais desafios de desenvolvimento enfrentado pelo Brasil e o mundo.
Para mais detalhes sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, clique aqui.
*Andréa Borges
Gerente Técnica do Consórcio PCJ, com Graduação em Biologia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Especialista em Gerenciamento de Recursos Hídricos pela Agência Nacional de Águas (ANA) e com Mestrado em Ciências Ambientais pela Universidade de São Paulo (USP)