Por Aguinaldo Brito Júnior*
Segundo o Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2024, publicado pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (ABREMA), cerca de 80 milhões de resíduos sólidos urbanos (RSU) foram gerados no último ano no país. Desse total, mais de 28 milhões tiveram a disposição final inadequada, acarretando potencialmente a degradação de solos, a contaminação da água e a proliferação de doenças.
Os resíduos, quando dispostos de forma inadequada, causam a poluição do solo, o acúmulo nas bocas de lobo e a obstrução das galerias de águas pluviais. Quando sem destinação correta, chegam aos rios, provocam diversos danos, como riscos à manutenção da vida aquática, contaminação dos corpos d’água, impactos à saúde pública e à segurança alimentar.
Dessa forma, visto que o Panorama da ABREMA aponta que cerca de 382 kg de RSU são gerados por habitante por ano, a gestão e o destino final dos resíduos continua a ser um dos maiores desafios nacionais.
DIFERENÇA ENTRE LIXO, RESÍDUO E REJEITO
Para entender a gestão de resíduos é necessário primeiramente compreender a diferença entre os termos lixo, resíduo e rejeito, que frequentemente são confundidos e usados para definir os produtos gerados após o consumo ou uso.
O termo lixo é mais usado em conversas informais e não é considerado um termo técnico no gerenciamento de resíduos. Lixo é todo e qualquer material considerado inútil, ou sem valor, gerado pela atividade humana, o qual precisa ser eliminado. Esse lixo pode ser separado em quatro tipos: úmido, seco, verde e especial. O úmido (resto de comida, papel higiênico) não é reciclável. O seco (papel, papelão, plástico), o verde (madeira, serragem) e o especial (pilha, bateria, material hospitalar, lâmpadas) são recicláveis.
Segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), o resíduo é todo material que sobra de processos derivados das atividades humanas, animais e processos industriais, como a matéria orgânica, o lixo doméstico, os efluentes industriais e os gases liberados em processos industriais ou por motores.
Já os rejeitos, de acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), são os resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade a não ser a disposição final ambientalmente adequada.
IMPACTOS DO DESCARTE INCORRETO
Seja lixo, resíduo ou rejeito, os impactos causados pelo descarte incorreto são igualmente prejudiciais. Quando lançado sobre o solo sem controle ou em lixões (o que não deveria mais existir, conforme a Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei nº 12.305 de 2010), ocorre um processo de contaminação que compromete a integridade ambiental, além de liberar o chorume, líquido de cheiro forte resultante de matéria orgânica em decomposição.
O chorume, por ser extremamente poluente, pode provocar graves danos ao meio ambiente, pois pode possuir em sua composição metais pesados, os quais podem se acumular no organismo e ser tóxicos, tanto para plantas, como para os animais. A longo prazo, compromete também a produtividade das lavouras e eleva os custos da agricultura, exigindo o uso intensivo de fertilizantes químicos.
Os contaminantes químicos presentes no lixo, como aqueles liberados pelo chorume, estão sujeitos, ainda, a infiltrar-se no solo até atingirem o lençol freático e os cursos d’água superficiais, alterando drasticamente a qualidade da água, comprometendo a saúde humana e aquática.
Ao alcançar os rios, os resíduos podem formar “ilhas de lixo”, prejudicando a sobrevivência da fauna e flora de diversas regiões. Os efeitos podem ser sentidos por muito tempo, visto que alguns materiais, como o plástico, demoram centenas de anos para se decompor, e durante esse processo, se transformam em microplásticos que podem ser confundidos por comida pelos animais, com impactos à sua saúde ou até mesmo levando-os a óbito.
Além disso, o descarte inadequado de resíduos pode causar a proliferação de insetos vetores de doenças, como o Aedes aegypti, causador da dengue, zika e chikungunya. Isso ocorre devido ao acúmulo de água parada no lixo, formando o criadouro ideal para esse mosquito.
QUAL A GESTÃO IDEAL E A MELHOR FORMA PARA DESCARTAR RESÍDUOS?
A gestão adequada e descarte correto de resíduos começa dentro de casa. A educação ambiental é fundamental para conscientização da sociedade, que ainda enfrenta dificuldades de entendimento quanto à separação correta do resíduo doméstico. Uma pesquisa realizada pelo Datafolha em 2024 com 2.010 pessoas de 112 municípios do Brasil, apontou que 42% dos entrevistados alegam não separar resíduos recicláveis por não ter o acesso ao serviço de coleta seletiva na sua cidade. Outros 21% relatam sentir preguiça de fazer essa separação, enquanto 18% dizem não ter informação suficiente sobre reciclagem para fazê-lo.
Há ainda uma parcela que justifica esse comportamento declarando não ter o hábito (4%) ou não ter tempo para a tarefa (4%). Apenas 3% dos entrevistados afirmam que não separam por não acharem importante fazê-lo.
Ao realizar o descarte, os restos de comida devem ser colocados em um recipiente separado, como uma lixeira comum, que deve ser esvaziada regularmente para evitar mau cheiro e atração de pragas. Os demais resíduos, como papel, papelão e plásticos, devem ser separados de acordo com seu grupo e destinados aos pontos de coleta seletiva da cidade. Os vidros devem ser embrulhados em jornais ou colocados em caixas para não ferir quem for coletar o lixo.
Após a separação dos resíduos de forma apropriada nas nossas casas, passamos para o próximo passo da gestão que é a coleta e a sua destinação correta aos aterros sanitários, que é a gestão adequada dos resíduos, com segurança para o meio ambiente e aos cursos d’água. Neles, os resíduos são compactados e dispostos em células ou áreas designadas. Camadas de solo e materiais impermeáveis são utilizadas para cobrir os resíduos regularmente, reduzindo os odores e evitando a contaminação do solo e da água subterrânea. Além disso, sistemas de drenagem de lixiviados (ou chorume) são instalados para coletar e tratar o líquido resultante da decomposição dos resíduos.
Os aterros sanitários também são equipados com sistemas de coleta de gases, como o metano, que é um subproduto da decomposição anaeróbica dos resíduos orgânicos. Esse gás é capturado e, em muitos casos, pode ser utilizado como fonte de energia, reduzindo a emissão de gases de efeito estufa.
Os aterros sanitários são projetados para serem operados de maneira controlada, com monitoramento regular da qualidade do ar, da água e do solo ao redor do local. Essas medidas visam proteger o meio ambiente, minimizar os riscos à saúde pública e promover a gestão sustentável dos resíduos sólidos.
No mês de junho, o Consórcio PCJ promoveu o encontro técnico entre empresas associadas à entidade na Orizon Valorização de Resíduos S.A – Ecoparque, em Paulínia (SP). Na ocasião, os associados puderam conhecer o Ecoparque, considerado o quinto maior aterro sanitário do Brasil, atendendo cerca de 5 milhões de habitantes. Diariamente, a unidade recebe cerca de 400 caminhões de resíduos, sendo que aproximadamente 60 ou 70% desse volume é composto por resíduos domiciliares.
Além dos aterros sanitários, a incineração, reciclagem ou compostagem são outras formas de tratar os resíduos. A incineração possui a vantagem de demandar uma pequena área para instalação e de reduzir o volume de resíduos descartados. Normalmente as usinas possuem tecnologia para filtrar a fumaça produzida pela incineração.
A reciclagem é uma das formas mais indicadas para a gestão de resíduos. Ela permite reduzir o volume de resíduos gerados, ao mesmo tempo em que evita o gasto de energia e de recursos naturais para a produção de novos materiais. O Plano Nacional de Resíduos Sólidos, instituído em 2022 no Brasil, possuí como uma das metas o aumento da taxa de reciclagem para cerca de 50% em 20 anos. Atualmente, o número é de apenas 8%, de acordo com o Panorama dos Resíduos Sólidos de 2024 da ABREMA.
Já a compostagem é uma maneira de aproveitar os resíduos orgânicos descartados diariamente, que de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), representam 51,4% da quantidade de lixo gerado. Através do processo, os resíduos orgânicos são transformados em um material estável e rico em nutrientes que pode ser utilizado na agricultura em substituição aos adubos químicos, por exemplo, os quais são nocivos ao meio ambiente.
AÇÃO EM CONJUNTO É NECESSÁRIA
O destino final dos resíduos é um dos maiores desafios ambientais da atualidade. Os dados mostram que a situação é alarmante e necessita ações em conjunto. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) atenta que nos últimos 50 anos houve uma explosão demográfica no território brasileiro, chegando a marca de 213,4 milhões de habitantes até 1º de julho de 2025. Consequentemente, o consumo aumenta e mais resíduos são produzidos, apresentando risco à saúde da população.
Porém, esses impactos podem ser significativamente reduzidos com a implementação de boas práticas de gestão de resíduos e o fortalecimento de políticas públicas para reforçar a educação ambiental, aumentar a taxa de reciclagem e diminuir a produção de resíduos no país.
Esse processo perpassa pela necessidade de sensibilização da sociedade sobre os impactos que os resíduos causam ao meio ambiente e à saúde das pessoas. O Programa de Educação e Sensibilização Ambiental do Consórcio PCJ, por exemplo, através do Projeto Gota d’Água, capacita educadores e alunos sobre a importância da água e dos seus temas transversais, sendo um deles a gestão correta de resíduos.
Outra boa experiência é o Teatro da Turma do Lamba que ensina crianças e adolescentes de diversas escolas de forma lúdica sobre gestão e descarte correto de resíduos, além dos impactos que essa poluição causa aos rios da nossa região. A peça já contou com duas temporadas em cartaz por diversas escolas de municípios das Bacias PCJ.
Some-se a isso, ainda, que o Consórcio PCJ possui o Programa de Saneamento e Resíduos Sólidos, que busca fomentar a conscientização e o planejamento de políticas públicas municipais e regionais, visando o estabelecimento de um sistema integrado e participativo de saneamento ambiental nas Bacias PCJ. O manejo correto de resíduos se caracteriza pela coleta, transporte, tratamento e destinação final adequada dos resíduos, com a finalidade de repensar, reduzir, reutilizar e reciclar os materiais.
A baixa taxa de reciclagem, falta de pontos de coleta seletiva em cidades e o aumento anual dos resíduos produzidos pela população trazem consequências ambientais e afetam a segurança hídrica dos mananciais. Ações e projetos com foco na redução do consumo, aumento da reciclagem e a promoção da educação ambiental devem ser reforçados e colocados cada vez mais em prática, a fim de que o destino final dos resíduos sejam mais sustentáveis.
O Consórcio PCJ, por meio dos seus programas de atuação, focado no fomento, planejamento e sensibilização, tem auxiliado municípios e empresas na gestão sustentável da bacia hidrográfica, a fim de mitigar possíveis impactos ambientais e à segurança hídrica, sempre focado na gestão eficiente da água e saneamento.
*Aguinaldo Brito Júnior
Coordenador de projetos do Consórcio PCJ – Engenheiro civil, com pós-graduação em Infraestrutura do Saneamento Básico.
Imagem: Gerada por IA