Montando um viveiro municipal: planejamento é essencial para o sucesso

Mudas são usadas para reflorestamento das bacias; qualidade e variedade das espécies devem ser priorizadas

O trabalho de reflorestamento das Bacias PCJ depende, fundamentalmente, da existência de mudas de plantas nativas para seu sucesso. Ao longo dos 30 anos de existência do Programa de Proteção aos Mananciais (PPM), o Consórcio PCJ tem atuado com as prefeituras dos municípios associados à instituição para a criação de viveiros municipais de mudas. Atualmente, o programa mantém parceria com 17 deles.

Para um viveiro de mudas ter sucesso é preciso, antes de tudo, muito planejamento. A afirmação é do engenheiro agrônomo especialista em Gerenciamento Ambiental pela ESALQ/USP (Escola de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo) e presidente da Jaguatibaia Associação de Proteção Ambiental, de Campinas, José Carlos Perdigão.

“Um viveiro tem como objetivo central multiplicar espécies vegetais para que elas retornem à natureza. Pode ser montado para produzir apenas mudas frutíferas, ou plantas ornamentais, ou nativas para restaurar nascentes. Nesse caso, o local deve ser estruturado para produzir mudas de espécies do bioma da região onde se encontra. Por exemplo, se estou no Nordeste, na caatinga, vou produzir mudas que ocorrem naturalmente naquela área”, explica.

É preciso ter um planejamento criterioso para a produção de mudas de qualidade, além de alta diversidade de espécies adaptadas aos ecossistemas do local onde serão produzidas. “Não adianta falar que vai restaurar e só colocar cinco mil pés de pitanga, por exemplo, porque pode vir uma praga e consumir tudo. A natureza se desenvolveu de forma que, para ter estabilidade a longo prazo, precisa da diversidade de espécies. Quanto maior o número de espécies produzidas para plantar, mais garantia tenho de perpetuação daquela restauração. Qualquer coisa que aconteça fora do normal tem indivíduos já adaptados para superar o problema”, detalha.

Perdigão destaca que o êxito de um viveiro depende diretamente da qualidade das mudas, que precisam estar bom estado nutricional, livres de pragas ou doenças, para garantir a alta taxa de sobrevivência no campo, depois do plantio.

Requisitos essenciais

A viabilidade de construção de um viveiro depende em primeiro lugar da disponibilidade de água da área, seja ela originada de represa, rio, ou mesmo poço. Além disso, a facilidade de acesso é importante, tanto para a entrega de insumos quanto para a chegada de quem vem buscar as mudas.

O viveiro precisa ser construído em um local ensolarado e com boa drenagem. “Se tiver uma pequena declividade na área onde vai ser instalado ajuda”, observa Perdigão.

O engenheiro agrônomo também fala que é preciso atenção quanto ao terreno estar livre de ervas daninhas e plantas de difícil controle, além de árvores que crescem rapidamente e com isso trazem sombreamento permanente às mudas.

O terreno deve ser dividido entre 50% de área para as mudas e o restante para os caminhos entre os canteiros, estrada de acesso, galpões para trabalho e depósito de materiais (substratos, adubos, ferramentas), além de escritório e residência para funcionário, se estiver localizado longe da área urbana.

É importante também haver um reservatório de água independente, para ser usado caso ocorra algum imprevisto como contaminação ou seca. “Esse volume armazenado, que dá para irrigar dois a três dias, já ajuda enquanto se resolve o problema”, comenta.

É preciso haver também um local de armazenar sementes, sejam elas coletadas do próprio viveiro ao longo do seu ciclo ou compradas. Importante também a colocação de uma fossa asséptica biodigestor, para que haja controle adequado de descarte de resíduos humanos.

O local precisa estar drenado, para que não fique encharcado, o que pode provocar doença fúngica, além de dificultar a circulação no local. “É importante ter um sistema de irrigação eficiente, para transportar água do reservatório através do pulverizador ou micro aspersor adequado a cada tipo de muda, que deve ser protegida do sol por sombrite ou plástico transparente.”

Além da água, as mudas precisam receber adubo mineral e orgânico, para que desenvolvam resistência e não sejam atingidas por pragas e doenças. Elas devem ser colocadas em saquinhos, tubetes, potes, ou até mesmo embalagens biodegradáveis, cujos tamanhos variam de acordo com a espécie plantada.

“Montar um viveiro de mudas de qualidade precisa de investimentos financeiros significativos. Não é uma atividade para leigos. Se você não sabe como fazer, estude ou faça uma consultoria adequada com quem sabe. A produção de mudas é uma atividade-chave para a gente fazer a restauração florestal, que hoje é exigência da sociedade”, conclui Perdigão.

Formas de produção das mudas

Perdigão também atenta para as vantagens e desvantagens no processo de produção das mudas por meio dos três métodos existentes: em saquinhos plásticos, tubetes e em embalagens biodegradáveis. Segundo ele, todos os métodos são bons e apropriados, porém, as mudas produzidas em tubetes e embalagens biodegradáveis apresentam desenvolvimento mais rápido e eficiente.

“Como as mudas de tubete e de embalagens biodegradáveis apresentam menos riscos de desenvolvimento de raízes enoveladas, permite que elas cresçam mais rapidamente e desenvolvam mais rápidas em comparação às mudas em saquinhos, com maior potencial de vida útil”, explica o engenheiro.

Perdigão explanou que os viveiros iniciaram a produção de mudas com saquinhos de papel e depois evoluiu para o tradicional saquinho de plástico, que possui benefícios e algumas limitações. As raízes das plantas possuem comportamento tecnicamente chamado de fototropismo negativo, ou seja, elas crescem sem parar na ausência de luz. O uso de saquinhos plásticos bloqueia a passagem de luz fazendo que as raízes das mudas não parem de crescer e, assim, gerando o enovelamento delas, o que comprometerá o seu desenvolvimento. Um problema central gerado por esse comportamento, é que mudas com raízes enoveladas geram árvores menos estáveis, com dificuldades de ancoragem e sustentação aérea, o que pode gerar quedas em temporais e movimentação de solo.

Já a produção de mudas em tubetes, as raízes crescem numa única direção. Como o fundo desse recipiente de armazenamento é vazado, quando a raiz cresce até o fundo encontra luz e para de crescer, gerando novas raízes. Esse processo não bloqueia a passagem da seiva para as raízes que crescem retilineamente e mais saudáveis. Ainda que sejam mudas menores em tamanho, elas se desenvolvem mais rapidamente que as mudas de saquinho.

O processo mais atual de produção de mudas é o realizado por embalagens biodegradáveis, conforme conta Perdigão. “Esse tipo de embalagem é um processo que evoluiu a partir de embalagens de plantas ornamentais. Ele funciona como um tubo oco que foi colocado e prensado substrato, o fundo tem o mesmo diâmetro da parte de cima, envolto por um tecido de celulose, biodegradável, com vantagem de produzir a muda levar a campo e plantá-la sem precisar retirar a embalagem, diminuindo consumo de plástico, entre outros benefícios”.

O engenheiro atenta ainda que nesse tipo de embalagem as raízes crescem para todas as direções de modo retilíneo, já que ao entrar em contato com o papel celulose, que permite a passagem de luminosidade, para o crescimento da mesma, formando novas raízes. Experimentos em campo, mostram que mudas produzidas nesse processo, se desenvolvem ainda mais rápido que as mudas de tubetes. “Superado alguns desafios para adaptar um tamanho de muda que ela possa ir a campo num porte com mais segurança, não tão pequena, que o potencial de produzir mudas em embalagens biodegradáveis é maior que os outros dois modos: em saquinho e tubete”, explica Perdigão.

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